De um tempo pra cá, a minha familia começou a fazer encontros, uma moda na cidade de Concórdia, como forma de reunir a familia que está espalhada por todo o Brasil. Assim começa também a curiosidade e a sistematização dessa história que pouco se conhecia e foi assim que em 2007 o André Lazzarotti, privo irmão, organizou um livro da família do Antonio Pio Lazzarotti. Dentre os vários capítulos do livro, tinha um, em especial, que os filhos do nono contavam a sua história. A história do Ari Lazzarotti, meu pai, acabou sendo escrita não por ele, mas sim por toda a sua familia, num processo bem interessante, onde tentamos relatar como foi essa história segundo a nossa visão e mantendo é claro, o bom humor, característica central da familia. No final a nossa mãe apresentou o texto e ele pediu para fazer uma pequena modificação mas concordou com a sua publicação.
Recuperei o texto escrito naquele momento e disponibilizo aqui como forma de homenageá-lo, nesse ano tão difícil da sua vida mas que está superando com muita força e já planeja vir a Itália e encontrar seus parentes...eta home que gosta de encontrar um parente!!!! Então aí vai a história....
Contar a minha história não é uma tarefa fácil, pois ela é recheada de episódios marcantes, “estórias” que até “Deus duvida”, mas eu lhes garanto que tentei, neste pequeno espaço detalhar os fatos mais importantes destes 60 anos, começando pela minha infância através das brincadeiras e da produção do trabalho junto ao meu pai, passando pelo casamento, pelo nascimento dos 4 filhos, das netas e, aliado a isso, a minha relação com a política, com a educação, com a música e com as plantas medicinais, sem falar, é claro das dívidas que me acompanham até hoje.
Esta história começa com o meu nascimento em 18 de setembro de 1946, passei minha infância brincando, jogando bola, matando passarinho e aprontando muito, mas também começou na infância as primeiras lições do trabalho. Aos oito anos de idade comecei a sair com meu pai com uma carrocinha puxada por uma mula velha para vender legumes e frutas na cidade de Concórdia. Estava aí o embrião da minha história de negociador, “briqueiro” e “roleiro” de sucesso que carrego até os dias atuais.
Sempre trabalhei muito, mas talvez essa não fosse a minha maior qualidade, e sim a alegria com que levava e levo a vida, características que herdamos e mantemos dos nossos pais. Como paixão pelo futebol a família mantinha na comunidade uma participação efetiva com geração de bons jogadores. Foi assim que joguei representado o time de Lajeado Quintino, e foram muitas as conquistas.
A música também foi uma forte herança da família, pois a mãe Teodolinda, com apenas três notas, ensinou todos os filhos a tocar violão, alguns aperfeiçoaram e até se profissionalizaram, eu mantive a tradição, com as três notas, animava bailes junto com o compadre Ladi e outras pessoas nos quais íamos a pé, dançávamos muito e chegávamos em casa no dia seguinte. Ensinei meus filhos a tocar violão, principalmente as “três notas” com a batida clássica do “tcha-tcha-pun”, a qual cantei em festivais, compus músicas e até gravei um CD caseiro com as melhores interpretações e composições.
Ari Lazzarotti com as 3 notas cantando em Goiânia |
Os números sempre estiveram presentes na minha vida, desde os cálculos das vendas de frutas e legumes com meu pai, o sonho de ganhar na loteria até o planejamento familiar em ter quatro filhos, sendo dois homens e duas mulheres para levarem os mesmos nomes dos pais: Loreni Lazzarotti Filha, Ari Lazzarotti Filho, Ari Luciano Lazzarotti e Loreni Luciana Lazzarotti. Matematicamente estava tudo dando certo faltava então, a concretização.
Moramos em Ipumirim por 10 meses. Neste tempo adotamos o Auri, irmão mais novo da Loreni, tinha 10 anos e passou a viver conosco, nos ajudando em tudo o que era necessário. Viveu conosco até se casar com Maria Almeida. Tiveram três filhos: Damião (em memória), Francieli e Amanda. A Francieli casou-se com Claudiomir da Silva e tiveram duas filhas: Nathaliê e Eduarda. Os mesmos residem em Chapecó.
Mudamos para a Linha Canavese, interior de Concórdia, ali no dia 05 de julho de 1969 nasceu nossa primeira filha, conforme tínhamos combinado ela levou o nome da mãe, Loreni Lazzarotti Filha. Muito saudável, ela cresceu forte, inteligente e serena, enchendo-nos de alegria. Por ter o mesmo nome da mãe, os amigos e familiares logo arranjaram um apelido que carrega até hoje. Carinhosamente é chamada de Lita.
Nossa vida não era fácil, enfrentávamos muitas dificuldades, foi a primeira vez que fomos a pique, ficamos com muitas dívidas, mas vivíamos felizes.
Coloquei uma granja de porcos, mas infelizmente não deu certo, mais uma decepção e mais dívidas sobraram.
No dia 26 de Setembro de 1970 nasceu nosso segundo filho que, conforme o planejamento, recebeu o nome de Ari Lazzarotti Filho, saudável, pequenino mas sapeca e, quando a Lita o viu, disse que ele era um neguinho o chamando de Gueguinho. Passou a ser chamado de Guego e, até hoje, carrega esse apelido que muitas vezes substitui o próprio nome.
Depois disso desmanchamos a granja de porcos e construímos uma casa para morar, onde colocamos uma bodega, com cancha de bocha. As dificuldades foram muitas, todo dia apareciam cobradores das nossas contas. As dívidas eram atualizadas e nunca neguei, sempre fui um homem honesto e honrado com elas, o problema era que as vezes elas eram muitas, eu tinha que “fugir” para não dizer sempre a mesma coisa: “um dia pago, mas agora não tenho dinheiro”. Para piorar as coisas, as crianças, ainda adoeceram, e pegaram coqueluche, não foi fácil, mas conseguimos vencer mais esta etapa.
Fomos morar em Lageado Quintino junto com os meus pais, seu Antônio e dona Teodolinda, trabalhamos na roça, plantamos fumo, soja e milho. Depois de um ano construímos nossa casa ali mesmo, onde compramos um pedaço de terra.
No dia 11 de março de 1973 nasceu nosso terceiro filho, Ari Luciano Lazzarotti, também muito saudável e nos deu novo ânimo. Nesse momento, fomos morar com os pais da Loreni, e mais tarde fomos para Barra Bonita, trabalhar numa olaria. Quanto trabalho, e pesado, mas vivíamos felizes com as três crianças. Foram tantas as mudanças que depois de 10 anos de casados colecionávamos 14. Mas não desanimávamos, mesmo que o trabalho era muito e, mesmo assim, não conseguíamos pagar as contas, foi aí que herdei o apelido de “Bradesquinho” em homenagem ao Banco Bradesco no qual vivia negociando meus papagaios.
Em 1977 fomos morar em Campo Erê , vida nova em Linha Vacum. Ali trabalhamos na roça e eu continuei minha vida de negociador e briqueiro. Em nossa mudança tinha uma peça que chamava atenção: um cofre de ferro. Para os que viam pensavam que havia muito dinheiro mas ali estavam as promissórias das falências e dos credores, que um dia iria pagar. A dificuldade foi tão grande no início que até o cofre teve que ser vendido para pagar as novas dívidas.
Longe de Concórdia onde se encontravam meus parentes, tive na família de Loreni um forte apoio para continuar a vida, mas, ao mesmo tempo, senti muita falta e a saudade era grande. Foi aí que construí as principais relações de amizade, de trabalho e de projetos para o futuro. Como professor do Mobral (ensino de jovens e adultos) e do primário para crianças, conheci e compreendi a cultura de várias comunidades abandonadas e excluídas socialmente como é o caso do Bracanjuva, uma comunidade de caboclos frutos de ocupações e que na maioria não possuíam identidade. Ensinei, registrei, batizei, casei e até enterrei várias pessoas nessa comunidade.
Como recenseador do IBGE andei por todas as comunidades do interior de Campo Erê conhecendo as pessoas, as dificuldades e, ao mesmo tempo, ia me aprimorando da tese das comunidades de base de uma ala progressista da Igreja Católica. Foi quando, em 1983 juntamente com alguns amigos fundamos o Partido dos Trabalhadores no qual fui presidente fundador e candidato a Deputado Estadual. Para tentar manter a candidatura, criei uma rifa de um fusca, que segundo meus cálculos iria subsidiar a campanha. No entanto, vendi poucos números e o sorteado foi o meu irmão Ico(Airton) que até hoje espera o tal fusca. Em decorrência disso, tive que abandonar a candidatura por falta de recursos para manter a campanha. Mas, mesmo assim, fiz 400 votos. Em 1988, o partido dos Trabalhadores de Campo Erê elegeu o primeiro prefeito do Estado de Santa Catarina, meu amigo Waldemar Dal Magro.
No dia 03 de janeiro de 1980 nasceu a Loreni Luciana Lazzarotti nos trazendo alegria e, ao mesmo tempo, a conclusão do projeto familiar dos quatro filhos, dois casais com os mesmos nomes dos pais e uma relação simétrica entre os mesmos. No ano de 1981, a Lita e o Guego foram estudar na cidade de Campo Erê, com o objetivo de dar continuidade aos estudos visto que na Linha Vacum só existia até a quarta série. Foi uma separação dolorosa para ambos, mas necessária e nós ficamos trabalhando no Vacum com os outros dois filhos. No dia 04 de fevereiro de 1987, a Lita se casou com o Eloi Dal Magro nesta mesma comunidade e fizeram residência ali mesmo. No dia 03 de agosto nasceu nossa primeira neta Bruna Maira e nos trouxe muita alegria.
No mês de fevereiro de 1988 vendi a propriedade da Linha Vacum em 36 vezes, tudo calculado para vivermos durante três anos. Mudamos para Presidente Castelo Branco, onde fomos morar numa propriedade do meu irmão Osvaldo, trabalhamos na roça, plantamos fumo e tínhamos outros afazeres. Em 1989 voltamos para Campo Erê e fizemos concurso público na Prefeitura e estamos trabalhando até hoje.
No ano de 1990 o Guego foi para Florianópolis estudar, passando por dificuldades, mas manteve seus objetivos e hoje é professor na Universidade Federal de Goiás onde continua estudando. Mora em Goiânia, casou-se com Alvina de Bastos e estão esperando a primeira filha.
No início de 1993 o Luciano foi morar em Campo Grande - MS onde aprendeu a profissão de marceneiro. Hoje está casado com Magda De Toni e administra uma pequena marcenaria.
A Lita, o Eloi e a Bruna foram morar em Lucas do Rio Verde – MT no ano de 1995 onde moraram durante 1 ano, enfrentaram muitas dificuldades e a Lita voltou a morar conosco. Em março de 1996 nasceu sua segunda filha, Bianca, linda e espoletinha, cresceu forte e saudável. Em fevereiro de 1998 nasceu sua terceira filha, Betina. Em janeiro de 1999, fixaram residência em Sorriso – MT, onde residem até hoje.
A Luciana mora conosco, trabalha o dia todo e a noite estuda em Pato Branco – PR. Está se formando em Ciências Contábeis.
Parte da familia reunida em Campo Grande-MS, tomando chimarrão e contando histórias |
Nestes 38 anos de casado enfrentamos muitas dificuldades, nos mudamos muitas vezes, não tínhamos residência fixa até virmos para Campo Erê. Lutamos, trabalhamos, mas nunca desistimos e sempre tivemos a presença de Deus que sempre nos deu força para vencermos.
Mas, e as dívidas? Pois é, quase pagamos todas.
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